O pastel




   Sabe aqueles momentos em que algo banal e idiota se torna um ideal de vida? pois é, o meu era comer o pastel perfeito. Mas a fome, assim como o amor, é cego. E, movido pela paixão de comer, cheguei ao lugar que resolveria meu problema, a princípio. Tinha cara de pastelaria, cheiro de pastelaria. No entanto, algo estava errado. Era como se eu não devesse estar naquele lugar, e sem saber o motivo. Mas a fome me empurrava adiante, pra eu pedir o pastel. E pedi. E sentei. E esperei.....e esperei aquela joça ficar pronta. Parecia que o tempo não passava. O infinito estava a paisana, vestido com o casaco dos milésimos, a calça dos segundos e o chápeu dos minutos. Então vi, no começo bem longe, uma vaga sombra, uma silhueta, que enquanto mais vinha, mais eu via. Aquela forma pastelonada crescia diante dos meus olhos. E com os olhos vinha de longe comendo. Quando chegou quase que tinha perdido a fome.
   Então o pastel tinha chegado. Legal. Aparentava algo entre o bom e algo mais abaixo. Sem mentira, parece que o pastel tinha pegado alguma doença. Tava pálido. Se bobear dava pra internar. Com medo que aquela coisa fosse contagiosa, vi que não precisava nem comer. Só o fato de estar perto já achava o suficiente pra fazer algum estrago. Mas pra meu azar, eu tava gravido de fome, e tava pra nascer. Comer já não era uma escolha.
   E começou a derradeira primeira mordida. A qual me arrependi, assim como de ter nascido para vivenciar aquilo. As próprias agruras da vida pediam arrego pela simples presença daquela entidade gastronômica. Foi como um primeiro contato ao desconhecido. Meus dentes roçavam no limiar de um buraco negro prestes a me puxar para galáxias distantes. Me senti um desbravador de mau gosto, literalmente. Mas eu insisti. O sabor havia de melhorar. Haveria de ter esperança. E então, lá bem no fim, quando comecei a ver a porta abrindo, e a luz, aos poucos, entrando, senti que era minha hora, hora de ir pro hospital e matar a aula do dia seguinte.







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